Em comunicado recente, relatoras/es da Organização das Nações Unidas (ONU) fizeram uma denúncia contra o governo do Brasil por suas “políticas irresponsáveis” durante a pandemia COVID-19. Para as autoridades, o país deveria abandonar imediatamente suas políticas de austeridade econômica mal orientadas, que estão colocando vidas em risco. Também recomendam ao Estado aumentar os gastos públicos no combate à desigualdade e à pobreza, que são exacerbadas pela pandemia.
A nota foi lançada pela ONU após organizações brasileiras terem recorrido às Nações Unidas para denunciar a postura do presidente Jair Bolsonaro, que tem ignorado as recomendações para a proteção da vida e da saúde das populações, emitidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
“Os cortes de financiamento governamentais violaram os padrões internacionais de direitos humanos, inclusive em educação, moradia, alimentação, água e saneamento e igualdade de gênero”, afirmaram relatoras/es especiais da ONU no comunicado. Assinaram a declaração conjunta: Léo Heller, relator sobre os direitos humanos à água potável e ao saneamento; Hilal Elver, relator sobre o direito à alimentação; Leilani Farha, relatora sobre o direito à moradia adequada; Dainius Pūras, relator sobre o direito à saúde física e mental; Koumbou Boly Barry, relatora sobre o direito à educação; e o Grupo de Trabalho sobre discriminação contra mulheres e meninas.
A notícia foi divulgada pelo jornalista brasileiro Jamil Chade em sua coluna. Segundo Chade, essa é a declaração mais dura já feita por relatores da ONU contra o Brasil por causa de sua forma de gerir a crise e uma das raras direcionadas contra um país específico por sua gestão sanitária.
Para relatoras/es da ONU que assinaram a declaração, o sistema de saúde brasileiro está enfraquecido e sobrecarregado, colocando em risco os direitos à vida e à saúde de milhões de brasileiros e brasileiras. “Já é hora de revogar a Emenda Constitucional 95 e outras medidas de austeridade contrárias ao direito internacional dos direitos humanos”, destacaram. As autoridades também denunciam o fato de o governo priorizar a economia sobre a vida das pessoas. “Em 2018, pedimos ao Brasil que reconsiderasse seu programa de austeridade econômica e colocasse os direitos humanos no centro de suas políticas econômicas”, disseram. “Também expressamos preocupações específicas sobre os mais vulneráveis, particularmente mulheres e crianças vivendo em situação de pobreza, afrodescendentes, populações rurais e pessoas residindo em assentamentos informais”, apontaram.
Emenda Constitucional 95 e o COVID-19
Aprovada no bojo de outras medidas econômicas regressivas levadas a cabo pelo governo do ex-presidente brasileiro Michel Temer, a Emenda Constitucional 95 (EC 95) de 2016, mais conhecida como emenda do “Teto dos Gastos”, estabeleceu um novo regime tributário e determinou que nenhum investimento público em áreas sociais poderá ser superior ao reajuste inflacionário por 20 anos. Dessa forma, neste período, educação, saúde e proteção social não receberão novos recursos.
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação do Brasil e outras entidades e movimentos sociais do país rejeitam veementemente a medida e, no início da crise sanitária em âmbito nacional gerada pela pandemia COVID-19, em março deste ano, apresentaram uma petição ao Supremo Tribunal Federal pela suspensão imediata da Emenda Constitucional 95 de 2016.
A motivação teve caráter emergencial, pois a pandemia coloca em risco o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e, devido à suspensão das aulas presenciais na rede pública de ensino e à impossibilidade de oferecer merendas, expõe milhares de crianças e adolescentes à miséria e à fome.