No Fórum Político de Alto Nível da ONU, plataforma oficial de monitoramento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em âmbito mundial, relatórios voluntários sobre a implementação dessa agenda foram apresentados pelos Estados do Chile e da Guatemala. Da região de América Latina e Caribe, quatro países anunciaram que participariam da revisão de 2019, relatando suas ações para o cumprimento dos ODS: Chile, Guatemala, Brasil e El Salvador. No entanto, esses dois últimos anunciaram às vésperas do Fórum Político de Alto Nível que não participariam mais da revisão.
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Os membros da Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação (CLADE) – Fórum pelo Direito à Educação Pública do Chile, Coletivo de Educação para Todas e Todos da Guatemala e Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina e do Caribe ( REPEM) – acompanharam a revisão presencialmente. Outras organizações da sociedade civil, incluindo as que integram o Grupo de Educação e Academia, e o Grupo Maior de Mulheres, articularam-se para que suas consultas aos governos fossem incluídas nos comentários apresentados por representantes da sociedade civil durante a sessão.
Na primeira metade da sessão de segunda-feira, 15 de julho, os Estados Azerbaijão, Chile, Filipinas e Serra Leoa apresentaram seus relatórios voluntários e, depois disso, abriu-se a palavra para que representantes de outros Estados e da sociedade civil apresentassem suas perguntas e comentários. Representantes da sociedade civil tiveram apenas quatro minutos para expor suas consultas aos quatro países, de uma única vez.
Na segunda metade da sessão, apresentaram seus relatórios Guatemala, Indonésia e Turquia. Em seguida, outros Estados fizeram perguntas, e a sociedade civil apresentou, em apenas dois minutos, suas questões aos três países.
Revisão do Chile
A subsecretária de Avaliação Social do Ministério do Desenvolvimento Social e da Família do Chile, Alejandra Candia Díaz, destacou entre as ações do Estado chileno para avançar no ODS 4: a elaboração de um plano nacional para a infância; e medidas para garantir uma educação de qualidade, modernizar a formação técnico-profissional, avançar na educação pré-escolar e erradicar o trabalho infantil.
Também destacou o desenvolvimento de um Plano Nacional de Direitos Humanos, o Plano de Compromisso País “Não Deixar Ninguém Para Trás”, e a aposta do governo em parcerias público-privadas e na articulação com o setor privado, a sociedade civil e a academia para dar respostas às mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável.
>> Relatório oficial do Chile (em espanhol)
Representantes dos Grupos Maiores de Crianças e Jovens, Indígenas e Mulheres, em diálogo com o Grupo de Educação e Academia, apresentaram indagações ao Estado Chileno, sobre a criminalização de estudantes, especialmente com a lei “Aula Segura”, que permite expulsar das escolas estudantes mobilizadas/os para defender seus direitos; a falta de prioridade ao financiamento da educação pública; a implementação e o monitoramento do Plano Nacional de Direitos Humanos; a inclusão da Educação Sexual e Reprodutiva nos currículos escolares para reduzir a gravidez na adolescência; e a eliminação de um programa com perspectiva de gênero do Ministério da Saúde.
Em resposta, a representante do Chile disse que o Estado trabalhou em colaboração com a sociedade civil para desenvolver o Plano Nacional de Direitos Humanos e que avançou no tratamento da violência contra as mulheres, a partir do Plano de Compromisso País. Acrescentou que as taxas de gravidez na adolescência foram reduzidas, revelando um avanço do governo nesse campo. No entanto, não respondeu as outras questões, especialmente as relacionadas à criminalização de estudantes, ao financiamento da educação pública e a retrocessos nas políticas de igualdade de gênero e educação sexual e reprodutiva. Também não respondeu a uma pergunta da representação do Estado do Canadá, sobre as medidas que estão sendo implementadas para a inclusão de meninas no ensino médio.
O Fórum pelo Direito à Educação Pública pressionou nas redes sociais por respostas consistentes do governo a essas perguntas. Também está divulgando amplamente o relatório-luz que preparou sobre o estado do ODS 4 no país.
No documento, destacam-se como barreiras para a realização do direito humano à educação: a criminalização de estudantes e docentes que se mobilizam para defender seus direitos; a perseguição a estudantes e ao pensamento crítico nas escolas, com a lei “Aula Segura”; o apoio financeiro do Estado a escolas privadas, em detrimento do direito à educação gratuita e pública; o projeto “Admissão Justa” e seus impactos negativos em termos de segregação e aprofundamento das desigualdades entre estudantes e centros educacionais; mudanças no currículo do ensino médio, que retiram Filosofia, História, Educação Física e Artes dentre as disciplinas obrigatórias, mantendo o ensino de Religião; e a ausência de políticas de educação sexual integral.
>> Relatório-luz que o Fórum pelo Direito à Educação Pública apresentou
Revisão da Guatemala
O Secretário de Planejamento e Programação da Presidência, Miguel Angel Moir, apresentou o relatório nacional voluntário da Guatemala. Destacou a articulação que se tem buscado no país, entre a implementação dos ODS e o Plano Nacional de Desenvolvimento 2032, em que as prioridades para o desenvolvimento nacional foram definidas em diálogo com diferentes setores da sociedade civil, incluindo: superação da pobreza, segurança, saúde, água e saneamento, gestão de recursos naturais, emprego e educação.
Moir afirmou que o plano de desenvolvimento nacional prioriza as pessoas e sua qualidade de vida, buscando promover a inclusão e a igualdade. No campo educacional, reafirmou o compromisso do Estado em garantir 12 anos de ensino primário e secundário gratuito para todas as pessoas, sem discriminação, com qualidade e eqüidade; investir em educação pública; e promover maior acesso ao ensino médio e universitário.
Quando a sessão foi aberta para perguntas e comentários dos Estados e da sociedade civil, o governo da República Dominicana perguntou: Como superar a baixa arrecadação de impostos e garantir recursos para alcançar os ODS? O representante da Guatemala respondeu que a baixa tributação no país é um grande desafio: a carga tributária no país é de apenas 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Disse que, para superar essa situação, o governo tem como tarefas: por fim à rigidez fiscal, enfrentar o contrabando e a evasão fiscal, realizar uma reforma econômica e reformar a política fiscal.
O Estado da Guatemala também foi indagado pelos Grupos Maiores de Mulheres e Povos Indígenas sobre a persistência da discriminação contra os povos indígenas e mulheres no país. O representante do governo respondeu, reconhecendo que os níveis de abandono e pobreza nas comunidades indígenas e rurais são problemas persistentes e que, de fato, as políticas de proteção social, inclusão dos povos indígenas e enfrentamento à discriminação e à desigualdade de gênero ainda são incipientes e devem ser melhoradas.
No relatório-luz que elaborou para contribuir com a revisão do ODS 4, o Coletivo de Educação para Todas e Todos da Guatemala destaca a necessidade de garantir os direitos de meninas, mulheres e povos indígenas.
No documento, também se afirma que é necessário superar a desigualdade de gênero na educação e garantir o direito dos povos indígenas a receberem educação em sua língua materna. Além disso, destaca que “a Guatemala continua enfrentando pobreza sistêmica, desigualdade, discriminação, exclusão e altos níveis de impunidade”, e que é necessário impulsionar a justiça tributária no país, para assegurar um financiamento adequado e justo para a educação pública e inclusiva.