A garantia do direito à educação gratuita e pública na América Latina e no Caribe tem como um dos desafios mais importantes coibir a privatização da educação que, com a chegada ou o fortalecimento de governos com características neoliberais, avançou na região.
Verifica-se em muitos países que o crescimento da privatização e o lucro na educação acompanham os cortes nos gastos públicos nos sistemas de educação pública e gratuita, o que precaria a educação pública e fortalece o discurso que ela se encontra em crise, e que as instituições privadas de ensino seriam a melhor opção em qualidade e resultados.
No âmbito do 3º Encontro Regional da Rede Mista de Parlamentares e Sociedade Civil pelo Direito à Educação na América Latina e no Caribe, realizado de 15 a 17 de outubro em San Salvador (El Salvador), a Campanha Latino-Americana de O Direito à Educação (CLADE) promove um debate entre ativistas e autoridades de diferentes países, sobre o problema do lucro na educação, seus impactos e como as estruturas legislativas podem fortalecer os sistemas públicos de educação, estabelecendo regulamentos e assegurando o controle social da educação privada.
Em preparação para este debate, compartilhamos abaixo algumas informações que se destacam do cenário de financiamento educacional e lucro em educação em quatro países da região: Argentina, Chile, Colômbia e Honduras.
Argentina: Redução real de 77% nos investimentos em infraestrutura e equipamentos escolares
O governo de Mauricio Macri, atual presidente do país, foi responsável por cortar mais de 55% no orçamento de ciência e tecnologia na Argentina. Além do corte no orçamento, o empréstimo de US$ 50 bilhões feito pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) ao governo argentino projetou para 2019 um ajuste das despesas públicas em programas de educação inicial e educação básica e secundária, levando a uma redução real nos investimentos em infraestrutura e dispositivos escolares de 77%.
Nesse contexto de ajuste econômico, o governo macrista passou a gastar mais com o pagamento da dívida pública do que com a educação. Para cada peso investido em educação em 2017, 1,55 pesos foram gastos com os credores do Estado, o que significou um corte nos recursos para programas socioeducativos, infraestrutura escolar, atividades culturais e informatização de centros educacionais.
De 2016 a 2017, os fundos públicos alocados à área como parte do orçamento nacional representaram uma perda de participação de 13%, o que implicou uma desvalorização dos salários dos professores em 16% abaixo da inflação em 2017.
Somente na província de Buenos Aires, existem mais de 850 escolas que não estão funcionando pelo mau estado dos edifícios, devido ao financiamento público insuficiente. A situação das universidades do país não é melhor e há demonstrações de estudantes e docentes em todo o país, para exigir mais investimentos públicos no ensino superior público e gratuito.
Chile: Projeto busca fortalecer competitividade entre escolas
Desde março do ano passado, trabalhadoras e trabalhadores do país questionam o Ministério da Educação pela falta de participação das comunidades educacionais na definição das diretrizes da política educacional e pelo uso de dinheiro público para fins de propaganda. Segundo os trabalhadores, a ministra Marcela Cubillos utilizou esses recursos para percorrer o país, com o objetivo de divulgar o projeto “Admissão Justa”, que visa incorporar a seleção de estudantes por mérito nas chamadas “Escolas de excelência do ensino médio”, além de defender “a liberdade de escolher escolas”, levando famílias a fortalecer a competitividade entre os centros educacionais.
As trabalhadoras e trabalhadores também se opõem à gestão da educação infantil no país, que promove iniciativas de parcerias público-privadas, com vales para a escolha de escolas privadas de educação infantil pelas famílias. Segundo eles, a mudança no artigo 203 do Código do Trabalho criaria um fundo financiado pela empregadora ou pelo empregador para pagar um berçário universal de baixa qualidade para filhas e filhos menores de 2 anos de mães que trabalham. Além disso, eles afirmam que essa mudança implicaria uma diminuição dos fundos de seguro-desemprego, garantidos às mães.
No que diz respeito ao ensino superior, as trabalhadoras e trabalhadores denunciam o atraso na implementação da Subsecretaria de Educação Superior, responsável por salvaguardar os direitos e obrigações das instituições e estudantes de ensino superior. Criticam também a mudança nos requisitos de gratuidade educacional, que resultou na perda retroativa desse direito para cerca de 28 mil estudantes.
Colômbia: Plano Nacional de Desenvolvimento favorece a privatização da educação e a perda de autonomia de cátedra
Ativistas, integrantes da comunidade educacional e representantes de povos indígenas afirmam que o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) não leva em conta o acordo assinado entre o governo e as organizações do setor educacional, nem define metas e indicadores para cumprir com a melhoria da educação no país, favorecendo a privatização da educação e a perda de autonomia de cátedra.
Outro problema é a falta de acesso e cobertura à educação de qualidade em contextos rurais. Apenas 48,5% dos diplomados do ensino médio colombiano conseguem ingressar na universidade, e o abandono da universidade é superior a 45%. Isso significa que aproximadamente metade dos que acessam a universidade não continua. Apenas cerca de 24,2% dos graduados do ensino médio se integram totalmente ao ensino universitário.
El problema también lo sufren los estudiantes universitarios cuando obtienen una licenciatura y están endeudados con el Instituto Colombiano de Crédito Educativo y Estudios Técnicos en el Exterior (ICETEX). Su futuro queda automáticamente hipotecado, de modo que para pagar el crédito educativo, necesitan más de una vida dado los altos intereses.
Honduras: Tendência à privatização e à participação de grandes empresas no ensino universitário
Dada a denúncia de que o governo hondurenho planejava privatizar os serviços de saúde e educação do país, médicas, médicos e docentes tomaram as estradas e suspenderam aulas e cuidados médicos e atendimento em hospitais e escolas públicas de Honduras. As mobilizações exigiram a revogação de decretos de emergência aprovados pelo Poder Executivo.
Nesse contexto, um forte conflito foi gerado entre o setor educacional e os poderes Executivo e Legislativo. As e os docentes acreditam que os novos decretos executivos afetam a estabilidade no emprego do magistério no país. Professoras, professores e estudantes, bem como a classe médica, pressionam para que esses decretos sejam abolidos. Também se esforçam para respeitar o relacionamento e a estabilidade no emprego, tanto de docentes como de médicas e médicos.
De acordo com os movimentos, as trabalhadoras e os trabalhadores da educação, há uma tendência do governo a favorecer a privatização e a participação de grandes empresas no ensino universitário, que têm influenciado, sobretudo, a formação docente e a avaliação estudantil.